Quando cometa 3I/ATLAS mudou de vermelho para verde no início de setembro de 2025, a comunidade astronômica ficou de queixo caído. Descoberto em 1º de julho de 2025 pelo Asteroid Terrestrial-impact Last Alert System, este é apenas o terceiro objeto interestelar a ser capturado dentro do nosso sistema solar, e a transformação de cor desafia o que sabíamos sobre a química dos cometas.
O programa ATLAS, que monitora o céu em busca de objetos próximos à Terra, detectou o cometa nas proximidades do Sol, atribuindo-lhe a designação C/2025 N1 (ATLAS). Logo após a descoberta, equipes do Instituto de Astrofísica de Canarias e do Nordic Optical Telescope confirmaram atividade cometária – um halo difuso de gás e poeira que indicava que o objeto já estava aquecido pelo Sol.
De acordo com as medições iniciais, a trajetória indica origem no disco fino ou espesso da Via Láctea, sugerindo uma idade de até 7 bilhões de anos, possivelmente mais antigo que o nosso Sistema Solar.
Os primeiros registros fotográficos em julho mostraram uma coloração avermelhada típica de cometas ricos em poeira. Porém, em 5 de setembro, imagens obtidas por David Jäger usando filtros azul e verde revelaram um brilho verde intenso ao redor do núcleo. "Nossas imagens mostram uma coma de gás com 2 arc‑minutos, visível claramente nos filtros azul e verde", relatou ele ao SpaceWeather.com.
Normalmente, o verde em cometas vem da emissão da molécula diatômica de carbono (C₂) que absorve luz ultravioleta e reemite em comprimento de onda verde. Contudo, espectros de alta resolução obtidos pelo Very Large Telescope (VLT) do European Southern Observatory em 25 de agosto mostraram níveis extremamente baixos de C₂, colocando 3I/ATLAS entre os cometas mais “depletados em cadeias de carbono” já observados.
O enigma levou Avi Loeb, professor da Harvard University, a propor uma hipótese alternativa: a explosão de produção de cianeto (CN) poderia estar gerando fluorescência verde. "A mudança de cor pode estar associada ao forte aumento da produção de cianeto, observado recentemente no espectro", sugeriu Loeb em um artigo co‑escrito com Richard Cloete e Peter Vereš.
Além de Loeb, outros especialistas expressaram ceticismo saudável. David Jewitt, do Instituto de Ciências Planetárias da Universidade de Havaí, comentou que "a presença de CN não explica totalmente o verde, mas indica processos químicos ainda pouco compreendidos".
Já Jane Luu, co‑descobridora do cometa interstelar 2I/Borisov, apontou para a necessidade de observações no infravermelho, onde outras moléculas voláteis podem ser detectadas. Observações com o James Webb Space Telescope já revelaram traços de amônia (NH₃), que também poderia contribuir para o brilho verde.
Um grupo liderado por Susanne Pfalzner (Universidade de Heidelberg) e Michele Bannister (Universidade da Califórnia) propôs que 3I/ATLAS poderia ser um "semente de formação planetária". Em seu artigo de setembro, eles argumentam que objetos sólidos de origem interestelar poderiam servir como núcleos pré‑formados, acelerando a acumulação de gás em discos protoplanetários.
Se essa teoria ganhar força, o cometa não seria apenas um fragmento gelado, mas um pedaço de matéria que já havia passado por processos de aglomeração em outro sistema estelar, oferecendo um “vislumbre de ouro” sobre como gigantes gasosos se formam rapidamente antes que seus discos desapareçam.
O NASA já alinhou recursos de múltiplas missões. O Hubble Space Telescope continuará monitorando a cor da coma, enquanto o SPHEREx mapeará a distribuição de composto voláteis. Uma curiosidade: a sonda Marte observará o cometa de perto quando ele passar a cerca de 28 milhões de km em 3 de outubro, oferecendo uma perspectiva de outro planeta.
O periélio solar, previsto para 29 de outubro a 1,36 UA, levará o cometa entre as órbitas de Terra e Marte. Depois disso, ele desaparecerá atrás do Sol até o início de dezembro, quando a Europa Clipper – ainda a caminho de Júpiter – poderá capturar imagens remanescentes. Em março de 2026, 3I/ATLAS fará seu mais próximo encontro com Júpiter antes de seguir rumo ao espaço interestelar.
Os cometas típicos ficam verdes por causa do C₂, mas espectros do 3I/ATLAS mostraram níveis muito baixos dessa molécula. A hipótese mais aceita agora envolve um aumento súbito de cianeto (CN) ou outras substâncias voláteis ainda não identificadas, o que gera fluorescência verde diferente do padrão.
Além de ser apenas o terceiro objeto interestelar detectado, 3I/ATLAS pode ser um "semente de formação planetária", oferecendo pistas sobre como núcleos sólidos aceleram a formação de gigantes gasosos em discos protoplanetários.
O cometa estará mais próximo do Sol em 29 de outubro de 2025 (1,36 UA). Ele fica visível até o fim de outubro, quando passa atrás do Sol; a observação retoma em início de dezembro, embora fique mais fraco.
Hubble, James Webb, SPHEREx e a sonda Europa Clipper (quando estiver em posição favorável) estão focadas em coletar dados espectrais e imagens de alta resolução do cometa ao longo de sua passagem.
Não. O ponto de maior aproximação da Terra será de cerca de 1,8 UA (aproximadamente 270 milhões de km), distância segura que elimina qualquer risco de colisão.
Arlindo Gouveia
outubro 5, 2025 AT 03:27Ao analisarmos a mudança espectral observada no cometa 3I/ATLAS, constatamos que a ausência de C₂ demanda uma revisão dos modelos de composição cometária. A presença de CN, embora detectada, não se mostra suficiente para explicar a emissão verde intensa. Ademais, a origem interestelar do objeto sugere processos químicos ainda pouco compreendidos. Por conseguinte, é imperativo que as próximas missões dediquem recursos a observações multibanda para elucidar essa anomalia.